O esquema de lavagem de dinheiro
formado por uma rede de empresas e cerca de 30 pessoas de Pernambuco e Goiás,
alvo da Operação Turbulência, da Polícia Federal (PF), pode ter atuado no
financiamento das campanhas do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB)
de 2010 e de 2014, e também no desvio de recursos da Petrobras e das obras de
transposição do Rio São Francisco. De acordo com a PF, a organização criminosa
teria movimentado mais de R$ 600 milhões desde 2010.
A investigação reuniu indícios de um
esquema criminoso que envolve contas bancárias de 18 pessoas físicas e
jurídicas, a maior parte delas empresas de pequeno porte, muitas de fachada,
que movimentavam valores milionários entre si e para terceiros com o objetivo
de lavar dinheiro de atividades ilegais. “Nós detectamos o envolvimento de
políticos, pelo menos no sentido de serem beneficiários de recursos. Agora não
posso alegar que apenas políticos faziam uso dele. Acredito que, na verdade,
seja bem mais amplo”, aponta a delegada de Combate à Corrupção, Andréa Pinho,
que atua no caso.
O delegado Daniel Albuquerque, cedido
da PF de Alagoas para contribuir na investigação, explica as transações: “Cada
empresa tem uma participação. Todas as empresas foram identificadas tendo
movimentações financeiras com as organizações envolvidas ou com os próprios
investigados, ou pessoas que emprestaram suas contas – e eventualmente recebiam
alguma coisa para isso – para eles são as formas que eram utilizadas para que o
dinheiro circulasse e se distanciasse de sua origem, provavelmente ilícita”,
explica.
Os empresários acusados de serem os
líderes da organização foram presos preventivamente entre a madrugada
e a manhã desta terça-feira (21). São eles Apolo Santana Vieira, Eduardo Freire
Bezerra Leite e João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, que recebiam valores
milionários por meio das empresas e seriam donos de várias delas.
Mandados
Ao todo, foram expedidos 60 mandados
judiciais, cinco deles de prisão preventiva. Além dos três empresários
apontados como líderes da organização, Arthur Roberto Lapa Rosal foi preso sob
acusação de atuar como testa de ferro, assim como Paulo César de Barros Morato,
que está foragido. Outros 24 mandados de condução coercitiva foram cumpridos e
essas pessoas prestaram depoimento na sede da PF em Pernambuco.
Além disso, estão sendo cumpridos 33
mandados de busca e apreensão. Até o fim da manhã já tinham sido apreendidas
três aeronaves – dois helicópteros e um avião – avaliadas em R$ 9 milhões, além
de US$ 10 mil apreendidos com Eduardo Leite, que viajaria para Miami e
desembarcava com João Carlos Lyra, em São Paulo, quando foi detido. O
bloqueio de contas e bens também está sendo realizado pela Polícia Federal.
Entre as empresas investigadas está
uma com sede no Uruguai, cujo dono é Oscar Algorta Raquetti, citado na Operação
Lava Jato por ter ajudado o ex-diretor da área Internacional da Petrobras
Nestor Cerveró a lavar dinheiro na compra de um apartamento de R$ 7,5 milhões
em 2009.
“Chamou a atenção que no mesmo
endereço dela existem 180 outras empresas, então há indicativo de que sejam de
fachada. Em segundo lugar ela integra o quadro social de uma empresa sediada em
Goiás que também está sendo alvo de investigação e que também não funciona na
prática. Mas a despeito disso, ela possui movimentações milionárias, que tem
como beneficiários, via de regra, os principais integrantes da organização
criminosa”, detalha Andréa Pinho.
Em Goiás, foram cumpridos três mandados
de busca e apreensão e dois de condução coercitiva – de um dos sócios da Oeste
Pneus, ligada à empresa do Uruguai e classificada pela PF como de fachada, já
que não possuiria atuação prática, e da procuradora da organização uruguaia
investigada.
Lava Jato
Para conseguir evidências de que as
empresas e pessoas investigadas estavam ligadas a transações ilícitas, a equipe
da Operação Turbulência cruzou dados com outros inquéritos da Polícia Federal,
inclusive três ligados à Operação Lava Jato. Dois deles estão no Supremo
Tribunal Federal (STF), e um segue na Justiça Federal em Curitiba (PR).
No inquérito da Lava Jato de
Curitiba, há indícios de que os operadores financeiros de empreiteiras citados
em delações premiadas estariam vinculados aos operadores pernambucanos. No
Supremo, existem menções ao uso da organização criminosa em um processo contra
os parlamentares alagoanos Benedito de Lira (PP) e Arthur Lira, pai e filho,
que usariam o esquema para receber propina da Petrobras.
Outro inquérito que está no Supremo e
cita os investigados da Operação Turbulência é sobre o recebimento de doação
ilegal para a campanha de Eduardo Campos ao governo do Estado, onde figura o
nome do senador por Pernambuco Fernando Bezerra Coelho (PSB), ex-ministro da
Integração de Dilma Rousseff (PT), como a pessoa que buscou esses recursos.
“O envolvimento do governador não
está sendo alvo das investigações, mas podemos afirmar, com base em
colaborações premiadas e no compartilhamento de provas que tivemos com outros
inquéritos, que as campanhas vinculadas ao ex-governador foram favorecidas ou
pelo menos tiveram recursos que vieram de empresas apuradas hoje na Operação
Turbulência”, declarou Andréa Pinho.
Ela também reforçou que os objetos da
investigação tornada pública hoje não são os políticos citados em outros
processos, mas as organizações envolvidas no suposto esquema de lavagem de
dinheiro.
Por telefone, o senador Benedito de
Lira disse à Agência Brasil que apenas recebeu doação do partido para
campanha de 2010. "Eu recebi apenas uma doação na minha campanha de 2010,
que foi de R$ 400 mil e veio do meu partido. Não recebi mais nada de ninguém,
não devo nada a ninguém. Não conheço essas pessoas, nunca vi", disse
Em nota, o senador Fernando
Bezerra Coelho repudia "a incorreta vinculação do nome dele à
"Operação Turbulência", uma vez que o senador não é sequer mencionado
nos autos desta investigação". "Fernando Bezerra afirma que não foi
coordenador das campanhas de Eduardo Campos, à Presidência da República, nem em
2010 nem em 2014; não tendo, portanto, exercido qualquer função financeira
nas campanhas de Campos. Quanto à investigação que tramita no Supremo
Tribunal Federal (STF) – ainda não concluída –, Fernando Bezerra Coelho
ratifica que sempre esteve à disposição para colaborar com os ritos processuais
e fornecer todas as informações que lhe foram e, porventura, venham a ser
demandadas. O senador reitera, ainda, que mantém a confiança no trabalho das
autoridades que conduzem o processo investigatório no STF, acreditando no pleno
esclarecimento dos fatos", diz o comunicado, divulgado pela assessoria de
imprensa.
Avião Cessna
O ponto de partida da investigação
foi o avião Cessna Citation PR-AFA, usado por Eduardo Campos na campanha à
Presidência da República em 2014, e cuja queda o matou no dia 13 de agosto com
mais seis pessoas. Naquele mesmo ano, João Carlos Lyra já tinha afirmado que
havia comprado o avião, mas chamou a atenção da polícia o fato de que nenhum
valor partiu pessoalmente dele.
“Então detectamos que o dinheiro que
saiu para comprar o avião partiu de empresas de fachada e pessoas vinculadas a
esse dono, também presos hoje na Operação Turbulência”, afirmou a delegada
Andréa Pinho. Uma das empresas citadas é a Câmara e Vasconcelos Locação e
Terraplenajem, apontada pela PF como organização de fachada. Em 2014, ano da
compra da aeronave, ela recebeu mais de R$ 18 milhões da construtora OAS –-
como pagamento de locação e terraplanagem realizada na obra de transposição do
Rio São Francisco.
A construtora, no entanto, não é alvo
nesse primeiro momento da operação. “A questão da OAS não tem vínculo direto
com a compra do avião, é bom que fique claro. Ela transfere o dinheiro para a
empresa que vem a contribuir para adquirir o avião”, ressaltou a delegada. Mais
cedo, durante a entrevista coletiva à imprensa, a delegada afirmou que caberá a
OAS explicar o pagamento para uma empresa identificada como de fachada.
Sumaia Villela e Mariana Jungmann
Da Agência Brasil
Nenhum comentário: