O Nordeste quase não é citado nos
programas de governo dos presidenciáveis Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro
(PSL), embora os votos da Região tenham sido decisivos para levar o País ao
segundo turno da eleição, no próximo dia 28. No programa do petista, o nome da
região só aparece uma vez, citado no Plano Nacional de Homicídios, mostrando
que a violência é grande em algumas capitais nordestinas. No plano de
Bolsonaro, algumas capitais nordestinas também são citadas no contexto de altos
índices de assassinatos, e o nome Nordeste aparece quatro vezes, num mesmo parágrafo,
se referindo a uma nova matriz de energia limpa e renovável, que terá como
matéria-prima os ventos e o sol. A proposta não é novidade, tendo em vista que
os ventos já são responsáveis por quase 50% da energia consumida nos Estados
nordestinos e há pelo menos metade de uma década os consultores do setor falam
que haverá uma expansão desses dois tipos de energia.
A região tem 28% da população
brasileira e é responsável por 14% de todo o Produto Interno Bruto (PIB) do
País. O PIB indica as riquezas produzidas num determinado lugar. “Essa
proporção vem se mantendo há cerca de 50 anos. Houve avanços no País e na região
em números absolutos, porque ambos cresceram”, comenta o sócio-diretor da
consultoria Ceplan e economista Jorge Jatobá. “As pessoas do Nordeste continuam
com 50% da renda per capita média das do Sudeste”, argumenta. A renda
domiciliar per capita média do País ficou em R$ 1.268 em 2017, sendo R$ 1.712
em São Paulo; R$ 597 no Maranhão; e R$ 852 em Pernambuco, segundo informações
da PNAD Contínua elaborada pelo IBGE. Esse cálculo soma os rendimentos
recebidos por moradores de uma residência e divide o valor pelo total de
habitantes do domicílio.
Para Jatobá, essas diferenças
regionais só diminuem com políticas públicas e instrumentos para fazer as
mesmas saírem do papel. O desenvolvimento regional é citado somente no programa
de Haddad, que diz ser fundamental a elaboração de uma Nova Política Nacional
de Desenvolvimento Regional e Territorial (PNDR). Mas descreve algumas
iniciativas que podem ser adotadas sem identificar propriamente os locais e de
onde virão os recursos a serem empregados.
Ainda no programa petista, há a
intenção de concluir a transposição de águas do Rio São Francisco, um projeto
que consiste na construção de dois grandes canais: os Eixos Norte e o Leste,
que vão abastecer cidades de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.
O Eixo Leste está pronto desde março
do ano passado, enquanto o Eixo Norte ainda está inconcluso. Em construção há
11 anos, esse projeto é muito importante porque vai dar segurança hídrica para
390 municípios do Nordeste.
O plano de governo de Haddad também diz
que serão “retomadas as ações de revitalização do Velho Chico e repactuados com
os Estados beneficiados”. Isso significa que será feita a cobrança da água aos
Estados. Também está previsto, no programa petista, a implantação de um
saneamento básico na bacia do São Francisco, sem explicar propriamente onde. A
área da bacia abrange 634 mil quilômetros quadrados. O rio começa na Serra da
Canastra, em Minas Gerais, e vai até a divisa de Alagoas e Sergipe.
Os programas de governo dos dois
candidatos, consultados pela reportagem do JC, são públicos e foram registrados
pelo PT e PSL no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As assessorias de
imprensa de Haddad e Bolsonaro foram acionadas, mas não responderam à
reportagem até o fechamento desta edição.
“A área de desenvolvimento regional
ficou fora do debate das eleições deste ano com todos os candidatos. Não há uma
visão sistêmica, coerente e propositiva para o desenvolvimento regional. Uma
política de desenvolvimento regional deve ter objetivos e instrumentos para que
as mesmas sejam executadas”, resume Jatobá. Nesse caso, instrumento pode ser
por exemplo um órgão para implantar essas ações.
Com relação às políticas de
desenvolvimento regional, o cientista político e professor da PUC-Rio Ricardo
Ismael afirma que não é uma questão de olhar para uma região ou não. “O que
está acontecendo é que o primeiro turno discutiu pouco os temas econômicos, de
desenvolvimento. Ficou em segundo plano, assim como a discussão de propostas.
Os ataques – seja por parte do Bolsonaro, com o antipetismo, ou do PT, com o
antibolsonarismo – estão pautando as campanhas”, diz.
O especialista acredita que não
haverá uma mudança da noite para o dia. “A dinâmica eleitoral é que está
tirando espaço de debater os problemas do País e, evidentemente, do Nordeste. O
que está faltando é o debate mais propositivo, de soluções para os problemas do
País, mas não sei se vai ter esse espaço não, pois o programa todo é muito
concentrado em ataques. A maneira de convencer os outros não é falando de propostas,
é atacando. Sou pernambucano, estou no Rio, que viveu uma crise imensa nos
últimos quatro anos, mas não tem nenhuma proposta para se resolver os problema
do Rio ou de São Paulo. Essas propostas não estão vindo e não sei se elas virão
no segundo turno”, concluiu Ricardo Ismael.
*Colaborou Renata Monteiro
Foto: O Povo/Ricardo
Stuckert/Divulgação
Do JC online
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