O
Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (28) que é
constitucional a lei que permite o sacrifício ritual de animais em cultos de
religião de matriz africana. Os ministros analisaram o tema através de uma lei
estadual do Rio Grande do Sul que deixou expresso que é possível o sacrifício
animal nessas situações. A autorização foi acrescentada no Código Estadual de
Proteção aos animais, que veda agressão e crueldade.
O
julgamento tinha sido iniciado em agosto do ano passado, com os votos do
relator, ministro Marco Aurélio Mello, e do ministro Edson Fachin, cuja posição
formou a maioria no julgamento desta quinta-feira. As divergências foram
pontuais. Por exemplo, para Marco Aurélio, o sacrifício de animais seria
aceitável caso a carne fosse direcionada ao consumo humano - observação que
ficou vencida no plenário.
A
tese fixada ao fim do julgamento foi de que é "constitucional a lei de
proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, permite o
sacrifício ritual de animais em cultos de religião de matriz africana
Por
outro lado, por unanimidade, os ministros entenderam que a lei do Rio Grande do
Sul que permite o sacrifício em ritual religioso é constitucional. A tese
fixada ao fim do julgamento foi de que é "constitucional a lei de proteção
animal que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, permite o sacrifício
ritual de animais em cultos de religião de matriz africana".
"Queria
deixar claro no pronunciamento do resultado que todos os votos foram no sentido
de admitir nos ritos religiosos o sacrifício de animais. A corte entendeu que a
lei do Rio Grande do Sul que permite o sacrifício em rituais religiosos é
constitucional", observou o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, ao
pronunciar o resultado, que foi comemorado pelos praticantes das religiões de matriz
africana que assistiam o julgamento do plenário.
A
maioria dos ministros destacou que a lei gaúcha não errou ao ter feito uma
designação especial as religiões de matriz africana, uma vez que a menção se dá
em um contexto de especial proteção às religiões de culturas que historicamente
foram estigmatizadas. "Penso que a razão é que as religiões de matriz
africana são as que têm sido historicamente vítimas de intolerância,
discriminação e preconceito. Não penso que seja tratamento privilegiado",
observou o ministro Luís Roberto Barroso.
Primeiro
a votar nesta quinta-feira - uma vez que foi responsável pelo pedido de vista
que interrompeu o julgamento em agosto -, o ministro Alexandre de Moraes
ressaltou que a oferenda dos alimentos, inclusive com a sacralização dos
animais, "faz parte indispensável da ritualística das religiões de matriz
africana".
"Impedir
a sacralização seria manifestar claramente a interferência na liberdade
religiosa", considerou.
"Não
se trata de sacrifício ou de sacralização para fins de entretenimento, mas sim
para fins exercício de um direito fundamental que é a liberdade religiosa. Não
existe tratamento cruel desses animais. Pelo contrário. A sacralização deve ser
conduzida sem o sofrimento inútil do animal", disse Barroso. "Me
parece evidente que quando se trata do sacrifício de animais nesses cultos
afros isso faz parte da liturgia, e portanto, está constitucionalmente
protegido", afirmou o ministro Ricardo Lewandowski.
Caso
O
caso chegou ao Supremo através de um recurso do Ministério Público gaúcho,
contra a previsão adicionada no código estadual. A decisão do plenário da Corte
afeta apenas a lei do Rio Grande do Sul, mas expõe o entendimento dos ministros
do STF, última palavra do Judiciário brasileiro, sobre o tema. Na ação apresentada
em 2006, o MP estadual destacava que a previsão adicionada pela lei é
desnecessária, já que a liberdade de religião é constitucionalmente garantida.
Quando
o julgamento foi iniciado no ano passado, em nome do governo estadual, o
procurador do Rio Grande do Sul Thiago Holanda Gonzalez afirmou que a lei não
traz nenhum prejuízo ao caráter laico do Estado. "A liberdade de culto
dessas religiões decorre da Constituição. Mas a lei não é inócua. Ela retira o
constrangimento às religiões de origem africana. O Rio Grande do Sul nunca
permitiu a crueldade (com animais)", afirmou.
Representante
da União de Tendas de Umbanda e Candomblé do Brasil, o advogado Hédio Silva
Júnior criticou a ação do Ministério Público estadual à época. "Parece que
a vida de galinha de macumba vale mais do que a vida de milhares de jovens
negros. É assim que coisa de preto é tratada no Brasil. A vida de preto não tem
relevância nenhuma. A vida de preto não causa comoção social, não move
instituições jurídicas. Mas a galinha da religião de preto, ah, essa vida tem
que ser radicalmente protegida", questionou na tribuna do Supremo.
Foto:
Nelson Jr./STF
Do
Estadão Conteúdo
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